No meu ritual, de um passeio pela foz,entre as palmeiras seculares,
numa penumbra que cai melancólica,sob um ceu raiado ainda de laranja
destas noites de verão que tardam em cair, ouço, velhas estórias de
mar , pescarias que se fizeram , num grupo onde ninguém se conhece e
onde todos se conhecem, até que o sono me conquiste e rume a casa,
questionando-me , porque fui tão feliz em nascer nesta terra, sempre
junto ao mar ao longo do que faço e do que cumpro, no que me foi
destinado...
Ouço esta estória de velhos, eremitas da foz, que esperam por estas
marés de 2006,há 60 anos... com amplitudes de menos que 00, para
apanharem as mais belas conchas, buzios, segredos que o mar revelou há
tanto tempo, tesouros que o mar nos dá e revela de 100 em 100
anos...uma geração conta a outra a estoria trasformando a verdade em
lenda...
Procuro-os pelos nomes, em ruas que terminam em sardinheiras
penduradas, numa aba de uma janela, com vista para a Afurada, com
vista para o Cabedelo...Onde ESTÃO??O Violas??O Ti António??O
Rabeta??O Safio??
O ronco da Boa Nova responde-me..póóóóó..póóóó,..Estão a apanhar
conchas responde-me..Juntam-se na praia do Molhe, dos Ingleses, com
oleados presos pela calça com uma corda, á cinta, espreitando cada
canto que o mar deixou olhar de repente,levando para casa tesouros,
que os netos num fim de tarde rebuscam no sótão, memórias, amores,
pertenças dos seus avõs queridos...
Daqui a 60 anos haverá outras marés iguais,já não estarei cá, mas
tenho a certeza que haverá sempre e eternamente apanhadores de
conchas, de sonhos, enquanto este plasma vivo de cores
intensas,avassalador,tempestuoso,e remançoso numa tranquilidade que
desce até ao ultimo raio de luz, onde mergulho, sempre, sempre num
azul tão profundo onde agora me despeço e tranquilo adormeço...
Deixando-vos até á proxima maré...
António Simões